19 May 2004

Da problemática do Bom-dia


Troco com frequência os cumprimentos estabelecidos quando encontro ou me despeço das pessoas. É comum, senão normal, sair-me um sonoro e sincero “Bom-dia” sob o (agora) abrasador Sol das 3h da tarde. Trocar a manhã pela tarde. E a noite pelas duas. Não tentei perceber o porquê de baralhar as várias fases que compõem um dia, limitei-me a aceitar a incapacidade de acertar no correcto. Isto, apesar de conjecturar, de quando em vez, se me sinto mais virado para a metafísica, que me agrada não cumprir as regras estabelecidas, mesmo que, ou se calhar por acontecer, de forma inconsciente.

Tentei durante uns tempos adoptar como fórmula mágica e única o “Bom-dia”. Isto porque, para além do mais, me parecia discriminatório, e sintomático de maiores problemas, a necessidade sentida de compartimentar um dia, como se fosse mais fácil ter horas certas para trocar de máscara, para mudar de discurso. Deixem-me dizer, de resto, que o meu problema se centra exclusivamente na hora marcada, na hora certa. O uso de máscaras não é apenas normal. É vital. Mas isso fica para outro dia.

Voltando à problemática da dissonância entre mundo real e mundo apreendido, deparei-me, como seria de esperar, com enormes dificuldades. A maior parte das pessoas não perdia a oportunidade para me responder: “Bom-dia? A esta hora?”, enquanto certamente pensava: “acabaste de te levantar, não foi?” ou “credo, o que a droga faz às pessoas”. Todas as minhas tentativas de explicar o porquê deste comportamento bizarro batiam de forma cruel no muro do hábito, do preconceito.

O que aliás faz sentido. Se o problema é meu, porque é que são os outros que têm de ter trabalho?

No comments: